
O dia ainda nem clareou entre as montanhas de Ouro Preto e Mariana, na região dos Inconfidentes, em Minas Gerais, mas duas mulheres que em comum têm em suas histórias de vida a determinação para vencer desafios e quebrar paradigmas já se preparam para ir a campo.
Renata Rodrigues Horta e Cleidiana Damião formam a primeira dupla de topografia exclusivamente feminina contratada pela ERG Engenharia — um marco histórico, que deve ser celebrado não apenas internamente, mas por toda a comunidade do setor mineral, que tem visto esse tipo de cena se repetindo com mais frequência nos últimos anos, num ambiente onde anteriormente se notava predominantemente a presença masculina.
Cleidiana, nascida em Piranga, cresceu entre a roça e a cidade, começou a trabalhar aos 6 anos e, após um percurso árduo de reinvenções e superações, encontrou na topografia uma nova paixão.
“Ouvi o anúncio da vaga no rádio e enviei meu currículo”, conta a ajudante de topografia, que completou dois meses na ERG no último mês de junho.
Já Renata, de Ouro Preto, descobriu sua vocação quando trabalhava em uma empresa de geoprocessamento, dirigindo para um topógrafo que não tinha carteira de habilitação.
“É gratificante ver o impacto positivo que as mulheres estão trazendo para nosso time. Elas trouxeram dedicação, profissionalismo, expertise e uma nova energia, enriquecendo nossa equipe com novas perspectivas e abordagens” Graziela Ferreira, COORDENADORA DE CONTRATOS
“Sempre fui muito observadora. Comecei como operacional e ao acompanhar o topógrafo no dia a dia fui me interessando, perguntando o porquê de cada coisa, como fazia o serviço, até que um dia ele sugeriu que eu fosse classificada como auxiliar de topografia. Fui aprendendo mais e três meses depois me classificaram como topógrafa”, lembra Renata.
A presença feminina em áreas técnicas, sobretudo na mineração, ainda é exceção e não regra no Brasil. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres representam atualmente 44,5% da força de trabalho brasileira, mas quando se trata do setor de construção civil e mineração, esse percentual cai drasticamente.
O último relatório da Agência Nacional de Mineração (ANM, 2022) mostrou que as mulheres ocupavam somente cerca de 10% dos postos formais na mineração — e, em funções técnicas de campo, como topografia, esse número é ainda menor.
Essas discrepâncias refletem um cenário em transformação, no qual exemplos como o da ERG têm impacto concreto e simbólico.

A topógrafa Renata, em campo, durante as medições usando um GPS
A chegada de Cleidiana e Renata à equipe não foi marcada por apreensão, mas por acolhimento. Elas descrevem o ambiente como um espaço de parceria, respeito e confiança, onde o aprendizado mútuo é constante.
“Eu achava que ia encontrar uma equipe fria, distante… Mas me senti como se estivesse em casa”, conta Cleidiana, que luta todos os dias para construir um legado de realização profissional e pessoal.
Renata lembra do impacto causado por sua presença nos primeiros dias de trabalho na sua carreira de topógrafa:
“Já ouvi perguntas de espanto, como ‘mulher pode trabalhar em mina?’. Hoje, provo diariamente que não existe profissão de homem ou de mulher. Existe capacidade”, relembra.
Graziela Ferreira, coordenadora do contrato Samarco Rotina Germano, onde Renata e Cleidiana trabalham, diz que a contratação da primeira equipe feminina de topografia reforça o compromisso da ERG com a diversidade, a valorização do talento feminino e o rompimento de estereótipos enraizados no setor.
“É gratificante ver o impacto positivo que as mulheres estão trazendo para nosso time. Elas trouxeram dedicação, profissionalismo, expertise e uma nova energia, enriquecendo nossa equipe com novas perspectivas e abordagens. Ainda há desafios, mas cada passo que damos reforça a ideia de que competência não tem gênero e que a diversidade fortalece todos os aspectos do nosso trabalho”, destaca Graziela.
A contratação de uma equipe 100% feminina de topografia é, portanto, mais que uma conquista individual ou corporativa: é uma resposta para tantas meninas e mulheres que enxergam, finalmente, a possibilidade de traçar novos caminhos em profissões antes consideradas predominantemente masculinas.
A cada marco fixado, cada linha desenhada no solo, o recado está dado — o futuro da mineração (e de tantas outras áreas) também se escreve com mãos femininas.
AVANÇO FEMININO
O exemplo da ERG Engenharia é sintomático do que começa a acontecer, ainda que lentamente, na mineração e em outros segmentos industriais. Em 2023, o IBGE apurou que as mulheres já são mais escolarizadas do que os homens: 19,4% delas possuem ensino superior completo, contra 15,1% dos homens. Porém, desigualdades persistem — a média salarial feminina é 22% inferior à masculina, e o teto de ascensão ainda é um obstáculo em diversas áreas técnicas.
